A reologia é a área da física que estuda o escoamento e a deformação da matéria. Ela descreve a deformação de sólidos, líquidos e gases sob a influência de tensões. Termo complexo para muitos, a reologia é um campo muito importante na pesquisa & desenvolvimento e controle de qualidade de diversos produtos cosméticos, principalmente, géis, emulsões e suspensões. De toda a área de estudo da reologia, talvez o conceito mais utilizado seja o de viscosidade, que pode ser entendida como a resistência de um fluido a qualquer mudança irreversível de seus elementos de volume com a aplicação de uma tensão. Alguns produtos possuem uma única viscosidade a uma dada temperatura independente da força de cisalhamento aplicada, mas não são todos os fluidos.
Entendendo a reologia
Os sólidos ideais se deformam elasticamente, ou seja, após remover a tensão a deformação é completamente recuperada. Os fluidos ideais (como os líquidos e gases) deformam-se irreversivelmente. A energia requerida para sua deformação é dissipada, pois eles fluem.
Sólidos e fluidos reagem de modo diferente quando deformados por tensões. Todavia, entre líquidos e gases, praticamente não há diferenças reológicas, afinal os gases são fluidos com viscosidade muito baixa. A viscosidade do gás hidrogênio, a 20°C, por exemplo, é um centésimo da viscosidade da água.
Parece simples, mas é confuso? Não se assuste. Ainda vai piorar um pouco mais porque vamos tratar de alguns conceitos importantes quando o assunto é reologia. Não se preocupe ainda se tudo parecer confuso no início, com o tempo a reologia pode ser sua melhor amiga.
Para a reologia, fluxo é a deformação que ocorre quando se aplica uma força de cisalhamento a um líquido. Já mencionamos que os fluidos não se deformam, eles escoam.
Fonte: Brunetti, 2008.
A tensão de cisalhamento é a quantidade de força aplicada em uma determinada área do fluido com um plano estacionário. É definida matematicamente pela equação:
A taxa de cisalhamento é o gradiente de velocidade de cisalhamento por uma determinada distância, expresso pela equação:
Um exemplo da tensão e taxa de cisalhamento é a aplicação de um creme sobre a pele. Ao espalhar o creme com as mãos, aplica-se uma força e uma velocidade de espalhamento. A altura da camada de produto entre a pele e a mão é a distância. Por isso é um fator de qualidade tão importante, pois o usuário quer repetir as boas experiências sensoriais ao utilizar um mesmo produto.
Newton descobriu que em muitos fluidos a tensão de cisalhamento é proporcional ao gradiente da velocidade, isto é, à variação da velocidade (a taxa de cisalhamento). Ele introduziu um coeficiente de proporcionalidade entre a tensão de cisalhamento e a taxa de cisalhamento (gradiente de velocidade), muito conhecido por todos nós como viscosidade dinâmica ou absoluta, ou apenas viscosidade. E ela é uma propriedade de cada fluido sob determinadas condições como a temperatura, por exemplo.
Ele definiu a lei básica da viscosidade, que descreve o comportamento de fluxo de um líquido ideal.
A unidade de medida da viscosidade dinâmica é o Pascal.segundo (Pa.s), mas também utiliza-se mili Pascal.segundo (mPa.s). No entanto, uma unidade de viscosidade ainda muito comum é o centipoise (cP).
A viscosidade tem origem na coesão entre as moléculas e os choques entre elas e a força necessária para tirá-las do repouso. Portanto, pode-se descrever a viscosidade como uma propriedade observada em fluidos em movimento (fluxo) e por isso a chamamos de viscosidade dinâmica. Em termos práticos, a viscosidade é a propriedade que indica a maior ou menor dificuldade de um fluido escoar (escorrer). Nos líquidos, a viscosidade diminui com o aumento da temperatura.
Tipos de fluidos e viscosidades
Em reologia, os fluidos que obedecem a lei de Newton da viscosidade são chamados de fluidos newtonianos. Esse tipo de fluido não tem sua viscosidade afetada por mudanças na taxa de cisalhamento em uma mesma temperatura. Alguns fluidos Newtonianos são água, óleo mineral e fluidos de silicone.
Os outros fluidos que não exibem o mesmo comportamento, são chamados de não-newtonianos e são classificados em duas categorias. Os fluidos não-newtonianos independentes de tempo são os fluidos pseudoplásticos, os fluidos dilatantes e os fluidos plásticos. Os fluidos não-newtonianos dependentes de tempo são os tixotrópicos e os reopéxicos.
Os fluidos pseudoplásticos apresentam diminuição drástica na viscosidade quando a taxa de cisalhamento excede um certo limite máximo. Isso pode parecer ruim à primeira vista, mas é justamente essa característica que possibilita que o creme dental seja expelido do tudo após exercermos uma pressão com os dedos. Ou ainda é uma característica que possibilita o envase de certas emulsões ao serem bombeadas para as máquinas de envase, pois em repouso sua viscosidade é alta, mas ao ser aplicada a pressão da bomba, com a velocidade, a viscosidade diminui. De modo geral, os fluidos recuperam sua viscosidade inicial quando o cisalhamento é reduzido ou interrompido.
Nos fluidos dilatantes a viscosidade aumenta com o aumento da taxa de cisalhamento (velocidade). É um comportamento mais raro, mas é observado em fluidos contendo argilas e amidos.
Os fluidos plásticos comportam-se como sólido em condições de repouso e após a aplicação de uma força (tensão de deformação) começam a fluir. O exemplo clássico desse tipo de fluido é o catchup.
Alguns fluidos apresentam mudança na viscosidade em função do tempo, sob a mesma temperatura e taxa de cisalhamento (velocidade). Os mais comuns são os fluidos tixotrópicos, que têm a viscosidade diminuída com o tempo. Os fluidos reopéxicos aumentam a viscosidade com o tempo, mas são muito raros.
Propriedade viscoelástica
Muitos produtos cosméticos apresentam comportamento reológico chamado de viscoelástico, pois são viscosos e elásticos, assemelhando-se a sólidos em intervalos de tempo curtos e a líquidos em intervalos de tempo longos. Observa-se esse comportamento principalmente em dispersões de polímeros, semi-sólidos como pastas e géis. Esses fluidos viscoelásticos contém uma rede de moléculas tridimensional que se deforma elasticamente.
Para medir a deformação na viscoelasticidade é necessário um reômetro (equipamento mais robusto que um viscosímetro) com tensão de cisalhamento controlada, dados não obtidos simplesmente com medidas de viscosidade ou de tensão de deformação inicial. O que pode ser feito em alguns casos é encontrar condições de teste para viscosímetros e taxas de cisalhamento baixas o suficiente para manter a resposta elástica insignificante.
Foto: maya picture / FreeDigitalPhotos.net
Como medir a reologia
A maioria de nós trabalha usando a chamada viscosidade dinâmica de Newton em equipamentos chamados viscosímetros de Brookfield. Como a equação da viscosidade dinâmica correlaciona a tensão de cisalhamento com a taxa de cisalhamento, fica mais claro agora porque devemos definir em nossas especificações uma agulha (ou spindle) e velocidade para medida de viscosidade em desses equipamentos. A agulha determinará a força de cisalhamento exercida no fluido e a velocidade vai determinar a taxa de cisalhamento exercida. Com isso, garantindo a mesma temperatura, em essa medida será reprodutível em qualquer equipamento do mesmo modelo.
Outro método usado para a medição de viscosidade é o (arcaico, mas econômico) Copo Ford. Esse tipo de leitura oferece como resultado a viscosidade cinemática do fluido, que é determinada pela ação que a força da gravidade exerce sobre o fluido ao passar por um capilar de diâmetro conhecido. A partir da densidade, a viscosidade cinemática pode ser convertida em viscosidade dinâmica pela seguinte equação:
Enfim, há ainda um universo a ser explorado na reologia de cosméticos, mas o principal fundamento é sem dúvidas a viscosidade. Compreender esse conceito e sua importância para os cosméticos já é o primeiro passo.
Tentei resumir nesse texto alguns conceitos importantes para a compreensão da reologia e apresentar alguns exemplos, pois esse ramo de estudo está muito presente nos cosméticos, mas pouca importância é dada a ele.
Referências
Boletim BrasEq. Viscosidade e Reologia: Noções Básicas. s/d.
BRUNETTI, Franco. Mecânica dos fluidos. 2. ed. rev. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2008.
PETRI, Hans-Michael. Introdução à reologia. Cosméticos & Perfumes, n. 10, jan./fev., 2001, p.42-50.
SCHRAMM, Gebhard. Reologia e Reometria: Fundamentos teóricos e práticos. 1a. ed. São Paulo: Artliber, 2006.
Artigo publicado originalmente em 7 de agosto de 2016
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