Se o universo dos cosméticos fosse um conto de fadas maniqueísta focado apenas no sensorial dos produtos, os petrolatos seriam vilões e os silicones certamente seriam mocinhos. Conforme vimos em Abril deste ano no texto publicado pelo Cosmética em Foco, não há motivos para tanto ódio. Sobre os silicones, perceberemos que também não há motivos para tanto amor.
De forma geral, os silicones têm aplicações muito (MUITO!) amplas, indo desde aplicações médicas, como cateteres, tubos de drenagem, próteses para pessoas que se acidentaram, implantes para cirurgias plásticas até lentes de contato, unhas postiças e produtos cosméticos, tais como xampus, condicionadores, protetores solares, etc. Também podem ser aplicados em pigmentos e corantes, resinas, borracha, fibras de vidro e tantos outros usos práticos.
Podemos imaginar a estrutura dos silicones (o Cosmética em Foco já explicou como ela é) como o átomo de silício sendo o elemento central e os átomos de carbono como se formassem um tubo ao seu redor. Essa estrutura o torna flexível e também o auxilia a se espalhar de maneira uniforme pela superfície (do cabelo, da pele, da unha, etc). Esta mesma estrutura favorece a entrada de moléculas gasosas, já que possui espaços livres. Assim, confere a ideia de maciez, leveza, além de favorecer altos índices de refração e, consequentemente, brilho.
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Estudos de María Emma Parente e colaboradores publicados na revista científica Journal of Sensory Studies (2008) retratam as diferenças sensoriais de duas das principais classes de silicones, cujos exemplos testados foram ciclometicone e dimeticone. Embora ambos sejam silicones, verificou-se que apresentam perfis sensoriais bastante diferentes um do outro. Qual a implicação disso? Quando adicionados às formulações, eles lhes conferem atributos sensoriais distintos.
O ciclometicone mostrou valores reduzidos para brilho, resíduo e oleosidade. Isso por ser explicado por ele ser volátil e, portanto, deixar menos resíduo sobre a pele. Já o dimeticone mostrou valores maiores para dificuldade de espalhar e pegajosidade. Isso pode ser devido ao fato dele ser mais viscoso e, portanto, mais difícil de espalhar.
Também por ser volátil, 10 minutos após a aplicação, o ciclometicone mostrou redução de 91% do resíduo. Desta forma, ele poderia ser classificado como um emoliente seco. Por outro lado, o dimeticone mostrou grande quantidade de resíduo logo após a aplicação e menor redução deste 10 minutos após a aplicação. O dimeticone pode então ser considerado como um emoliente que protege mais, já que o filme que forma dura mais tempo.
Sobre a oleosidade, o ciclometicone mostra redução significativa 5 minutos após a aplicação. Após 10 minutos, apresenta redução de 87%, sendo um emoliente que deixa pouca sensação oleosa e que rapidamente desaparece. A principal vantagem disso é que ele pode ser utilizado em formulações cosméticas para diminuir a sensação oleosa após a aplicação. Já o dimeticone apresenta redução intermediária.
Estes resultados são especialmente importantes para o desenvolvimento de novos cosméticos, uma vez que diferentes silicones podem ser selecionados para integrar a formulação de acordo com o claim do produto final. Por exemplo, se o produto é para a noite, para o inverno ou para peles secas, o dimeticone poderia ser escolhido, já que forma um filme sobre a pele que dura por mais tempo. Por outro lado, se o produto é um creme para o dia, para o verão ou para o corpo, o ciclometicone seria mais recomendado, por proporcionar pouca sensação de resíduo oleoso e também por desaparecer rapidamente.
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A fim de melhorar algumas propriedades dos silicones voláteis, surgiram os elastômeros. Em associação com os ciclometicones, ambos conferem à formulação o mesmo sensorial (desejável) porém com melhor controle sobre viscosidade e estabilidade. Em estudos comparativos realizados por Isabele Van Reeth publicados na revista científica Journal of Cosmetic Dermatology (2006) é possível observar que os elastômeros propiciam melhor espalhabilidade, menor sensação de pegajosidade, menos brilho e também absorção da formulação até níveis mais profundos da pele.
Ao formular, é preciso que se façam escolhas: tudo bem o produto se acumular nos fios de cabelo? Tudo bem não aderir ao fio e ser apenas um agente condicionante leve? Os silicones, indiscutivelmente, agregam à formulação características essenciais para fazer o produto sensorialmente agradável, embora não o tornem mais eficaz e ainda possam contribuir negativamente em relação ao acúmulo de produto sobre as superfícies corporais onde foi aplicado ou em questões ambientais de descarte de resíduos. Ou seja, eles beneficiam a estrutura da formulação em si. Quanto ao consumidor e ao meio ambiente, algumas tendências contrárias ao uso de silicones têm surgido e se propagado de forma expressiva.
Entretanto, ainda não se encontrou outro ingrediente (comprovado cientificamente) que tenha exatamente a mesma atividade que os silicones. Então que tal repensar se eles realmente precisam fazer parte da formulação? Se não podem ser substituídos? Se não podem ter sua concentração reduzida? Afinal, não vivemos em um mundo maniqueísta e as ferramentas das quais nos valemos podem ser boas e ruins dependendo do uso que fazemos.
E os óleos vegetais não possuem ação semelhante aos silicones?
Juh, comparando óleos vegetais com ciclometicone e dimeticone a ação é completamente diferente. Esses dois silicones não inertes, não têm nenhuma ação sobre a pele ou os cabelos apenas benefícios sensoriais. Mas há sim alternativas! O que existe disponível são ésteres de origem vegetal que proporcionam sensorial semelhante a esses silicones, mas é necessária uma mistura de vários para obter o mesmo resultado.