Estudos apontam que aproximadamente 50% da população tem algum tipo de insatisfação com a sua aparência. Parte deste grupo procura por procedimentos estéticos para corrigir traços considerados indesejáveis, com o objetivo de melhorar sua autoestima, autoconfiança e, consequentemente, qualidade de vida. A busca por tratamentos cosméticos minimamente invasivos vem crescendo a cada ano. Nos Estados Unidos, observou-se crescimento de 77% nesta busca entre 2000 e 2010. No Brasil, esta busca sempre foi grande e, conforme evidencia a tendência, vem crescendo consideravelmente.
A celulite acabou por se tornar uma preocupação entre as mulheres que vivem em áreas tropicais, como o Brasil, já que há maior frequência de exposição do corpo. Desta forma, a celulite pode gerar relevante impacto social e ser motivo de procura por tratamentos específicos.
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Assim como estudos apontaram serem frequentes os relatos de desconforto emocional por parte de pacientes com queixas de celulite, também foi possível observar que pacientes apresentam melhora na qualidade de vida e autoestima após tratamentos. Em estudo realizado com 46 mulheres, 78,3% delas relataram que se sentem constrangidas em relação à presença de celulite, bem como obrigadas a buscar por tratamentos. Sobre esta busca por tratamentos, uma pequena parcela das pacientes (6,5%) se sente influenciada pelo parceiro, enquanto 28,3% aponta ser influenciada da mídia.
No texto anterior, o Cosmética em Foco já ressaltou que a celulite possui causas multifatoriais e não completamente conhecidas. Na contramão das dezenas de tratamentos apontados como eficazes sem qualquer rigor científico, a ciência não reconhece que haja um tratamento eficaz e definitivo. Além disso, há ainda propostas terapêuticas baseadas em publicações de qualidade questionável. O que isso quer dizer? Que grande parte dos tratamentos popularmente conhecidos não apresenta de fato evidência científica suficiente de melhora para a celulite. Para piorar, poucos são os grupos de pesquisa ao redor do mundo que se dedicam ao assunto. Desta forma, o conjunto de tratamentos, formulações cosméticas, atividade física e dieta podem resultar em mudanças positivas em relação a melhora de quadros de celulite, contudo é muito difícil que alguma destas alternativas ao ser adotada isolada das demais cause o efeito esperado.
Cientificamente já sabemos que tratamentos tópicos são ineficazes, embora alguns possam ser coadjuvantes aos demais. Sabemos também que, até o momento, não há tecnologia capaz de corrigir as alterações estruturais do tecido adiposo feminino e da derme profunda.
Abordaremos a seguir alguns tratamentos cientificamente avaliados quanto aos benefícios na melhora da celulite. Mas salientamos uma vez mais: apenas tratamentos multidirecionais são capazes de trazer resultados minimamente satisfatórios.
Os tratamentos para celulite
Os tratamentos para celulite descritos na literatura médica mundial estão divididos em dois grandes grupos: os não invasivos e os invasivos. Conforme citamos acima, as técnicas não invasivas tornaram-se procedimentos muito difundidos e estão crescendo rapidamente em áreas de medicina estética. Esta preferência se dá pelo fato de que a grande maioria dos métodos invasivos tem riscos inerentes e complicações como dor, inchaço, recuperação prolongada, cicatrização, hematoma ou infecção. De acordo com os dados divulgados em 2013 pela Sociedade Americana para Cirurgia Plástica Estética (American Society for Aesthetic Plastic), o risco significativo de procedimentos invasivos de contorno corporal levou ao crescimento de 521% das técnicas não invasivas a partir de 1997. Além disso, estima-se que os procedimentos não invasivos cresçam 21% ao ano.
Tratamento para celulite não invasivo sem substâncias biologicamente ativas
1) Massagem/Endermologia:
Vários métodos de massagem são descritos em trabalhos científicos. O mais popular é a drenagem linfática, devido à teoria de que alterações na drenagem linfática fisiológica estariam envolvidas na causa da celulite.
É possível que as massagens sejam realizadas manualmente ou por equipamentos que, na teoria, obtém maior rapidez e consistência (método este denominado endermologia).
Há discordâncias entre os estudos científicos quanto à eficácia deste tratamento, já que alguns estudos comparativos demonstram melhora e outros não observaram essa diferença.
2) Dispositivos baseados em luzes:
Podemos citar luz intensa pulsada (LIP) e laser.
Sobre a LIP, seu princípio consiste em estimular a formação de colágeno, o que tornaria a derme mais espessa e assim mais semelhante à derme masculina, que é menos susceptível à celulite. Cientificamente não se pode comprovar a eficácia do método nem melhora clínica da celulite, pois o único artigo científico referente à LIP disponível deixa brechas, tais como: não estudar grupo-controle nem histologia, fazer uso de uma substância ativa junto à LIP, dentre algumas outras deficiências que dificultam o entendimento sobre haver ou não melhora na celulite.
O emprego do laser isoladamente é incomum e pouco citado em artigos científicos.
É muito comum o uso de equipamentos que associam laser e LIP com outras técnicas, tais como massagem, vácuo e ultrassom. São estas as alternativas mais difundidas comercialmente, mais populares entre os pacientes e com maior número de estudos publicados. A justificativa desta junção de métodos seria a atuação simultânea contra várias causas da celulite, tais como alterações estruturais do colágeno, microcirculação e drenagem linfática. Muitos são os dispositivos disponíveis e, embora muitos sejam os estudos existentes sobre eles, as deficiências permanecem: falta de grupo controle, amostra pequena, conflito de interesse, uso fora do que é permitido por agências reguladoras, etc.
3) Radiofrequência:
Refere-se ao uso de ondas eletromagnéticas para aumentar a temperatura da pele mais profunda sem qualquer dano epidérmico ou dérmico. É válido ressaltar que não há protocolo padrão para frequência e tempo de tratamento e existem opções que vão de 1 a 24 semanas. Além disso uma temperatura mais alta, mesmo que por um período mais curto, pode ser letal para o tecido adiposo além de ser desconfortável para a paciente. O uso da técnica por oito a dez minutos com temperatura mais baixa já é capaz de proporcionar o dano pretendido às células de gordura. Estudos científicos apontaram que os resultados da técnica para tratamento de celulite foram baixos e limitados.
4) Terapia extracorpórea de ondas de choque:
Embora seu mecanismo completo ainda não esteja claro, é possível que se baseie na conversão de energia elétrica em energia mecânica. A energia criada neste processo mantém-se limitada às zonas alvo, não sendo observadas alterações significativas no tecido localizado ao redor das zonas alvo. O poder e a eficácia são afetados pela energia e frequência das ondas de choque, bem como pelo número de pulsos e os intervalos de tratamento. No tratamento da celulite, o método seria eficaz quanto à remodelação do colágeno da pele. Contudo mais estudos são necessários para que alguma conclusão mais precisa possa ser alcançada.
Tratamento para celulite não invasivo com substâncias biologicamente ativas
Uma vez mais, são raros os produtos tópicos disponíveis no mercado para o tratamento da celulite que dispõem de estudos científicos confiáveis.
Dentre os estudos confiáveis, os que apresentam melhores resultados (ainda que sejam discretos) são os retinóides e as metilxantinas. A Centella asiática e o Sillicium também são propagadas como eficazes, porém seus estudos ainda são escassos. Quanto à infinidade de outras substâncias divulgadas como eficazes, não há evidências científicas suficientes e os resultados são, portanto, questionáveis.
Sobre a Centella asiática, ativo bastante conhecido, ela normaliza a formação de colágeno ao nível dos fibroblastos através do controle da fixação de alguns aminoácidos. As células de gordura são soltas promovendo a liberação de gordura localizada através da penetração de enzimas lipolíticas, e consequentemente as trocas metabólicas entre a corrente sanguínea e as células do tecido adiposo se normalizam, melhorando a circulação venosa de retorno.
Uma vez que os produtos cosméticos são coadjuvantes no tratamento da celulite, eles podem atuar por três mecanismos diferentes: metabolizando a quebra de células de gordura, melhorando a drenagem através de ativadores da circulação e reestruturando o tecido lesado através de renovadores de colágeno.
Segundo alguns autores, as substâncias ativas precisam alcançar a hipoderme, onde estão as células de gordura, para que haja diminuição seletiva e bem-sucedida destas células. É por isso que muitos produtos anticelulite estão associados a promotores de permeação. Assim, eles atuam promovendo o aumento da circulação e ativando a permeabilidade da pele.
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Tratamento para celulite invasivo sem substâncias biologicamente ativas
Nesta categoria, podemos citar duas intervenções cirúrgicas: a subcisão e a lipoaspiração.
Subcisão é uma técnica cirúrgica invasiva em que, com uma agulha introduzida no tecido subcutâneo, são feitos movimentos paralelos à superfície cutânea com o objetivo de romper estruturas de tecido fibroso, tecido este bastante influente nas causas da celulite. Não há evidências científicas confiáveis e existe a possibilidade de recidiva e efeitos adversos, como hiperpigmentação e eritema persistente.
Já a lipoaspiração é a técnica cirúrgica mais comum para redução do tecido adiposo, mas os resultados não são tão satisfatórios para o tratamento da celulite. Opções como a lipoescultura ultrassônica podem ser mais bem-sucedidas no tratamento da celulite, contudo os estudos sobre essa aplicação ainda são escassos.
Tratamento para celulite invasivo com substâncias biologicamente ativas
A mesoterapia consiste na aplicação injetável de medicações. Os métodos são muito variáveis, bem como as substâncias injetadas. Cientificamente não se pode comprovar a eficácia de nenhum deles no tratamento da celulite, embora na teoria prometam milagres.
É importante ressaltar que se corre o risco de contaminação dos produtos em uso, além de efeitos colaterais sistêmicos, uma vez que a aplicação pode não ficar restrita ao local, mas alcançar o corpo todo através da circulação.
Um exemplo bastante popular deste tipo de tratamento é a carboxiterapia, que faz uso de injeções de gás carbônico. Cientificamente não é possível atestar nem sua eficácia, nem sua segurança.
Afinal, qual o melhor tratamento para celulite?
Cada vez mais fica evidente que a única forma de corrigir as alterações observadas na superfície da pele será através de tecnologia capaz de atingir, com segurança, a derme profunda e o tecido adiposo superficial. O grande desafio é encontrar um método não-invasivo único para tratar celulite. Algumas falhas metodológicas em estudos científicos existentes tornam muito difícil a obtenção de resultados confiáveis e parece não existir um método de tratamento definitivo para a celulite. Para complicar ainda mais, um método efetivo para redução de gordura subcutânea pode não funcionar para celulite por exemplo.
A avaliação precisa dos resultados das terapias anticelulite não é fácil. Mas atualmente existem alguns métodos práticos para medir tais resultados, como imagens de ultrassom em tempo real, medição tridimensional da superfície da pele, fotografia clínica, achados histológicos, questionários pessoais, etc.
Um dos aspectos mais importantes para se avaliar qualquer que seja o método de tratamento escolhido é a satisfação da paciente. E esta satisfação raramente é alcançada, já que geralmente se esperam resultados semelhantes ao de procedimentos cirúrgicos.
É inegável que a auto estima está atrelada a conceitos sociais do que é aceitável ou não. Valendo-se a celulite de um fator genético (e, portanto, impossível de fugir!) e estando presente na maioria esmagadora de mulheres e alguns homens inclusive, por que tanto esforço para tentar ganhar uma luta na qual já começamos perdendo?
Referências Bibliográficas:
AFONSO, João Paulo Junqueira M. et al. Celulite: artigo de revisão. Surgical & Cosmetic Dermatology, v. 2, n. 3, p. 214-219, 2010.
ALIZADEH, Zahra et al. Review of the Mechanisms and Effects of Noninvasive Body Contouring Devices on Cellulite and Subcutaneous Fat. International journal of endocrinology and metabolism, v. 14, n. 4, 2016.
DE FIGUEIREDO, Samanta Gonzaga; MEJIA, Dayana Priscila Maia. O uso da cosmetologia associada à massagem modeladora no tratamento da celulite. Revista Amazônica de Saúde, v. 1, n. 1, 2016.
HEXSEL, Doris et al. Avaliação dos aspectos psicológicos, psiquiátricos e comportamentais de pacientes com celulite: estudo-piloto. Surgical & Cosmetic Dermatology, v. 4, n. 2, 2012.
E sobre ultrassom, alguma consideração??
Olá Juliana, a consideração sobre o uso de ultrassom no tratamento da celulite está no texto: ainda há pouca evidência significativa de sua eficácia. No quarto parágrafo do tópico 2: “Muitos são os dispositivos disponíveis e, embora muitos sejam os estudos existentes sobre eles, as deficiências permanecem: falta de grupo controle, amostra pequena, conflito de interesse, uso fora do que é permitido por agências reguladoras, etc.” Não basta haver publicação científica sobre o assunto, é necessário que as publicações sejam relevante confiáveis. Infelizmente para a área de estética, a falta de credibilidade das publicações é uma realidade.