A edição de 2016 do Sustainable Cosmetics Summit (SCS) Latin America aconteceu na cidade de São Paulo nos dias 14 e 15 de Setembro. Como de costume, os assuntos abordados foram materiais naturais, impactos sociais e também relacionados ao mercado consumidor, além de temas relativos à marketing. E o que teve de diferente? Pela primeira vez, a organização do evento optou por discutir questões sociais e de segurança dos cosméticos sob o olhar da sustentabilidade.
Desde 2009, os organizadores (Organic Monitor) buscam abordar o desenvolvimento de produtos cosméticos a partir de conceitos sustentáveis, sendo o objetivo da cúpula encorajar a sustentabilidade na indústria da beleza através do encontro de stakeholders (proprietários de grandes marcas, fornecedores de matérias-primas, distribuidoras, empresas de embalagens, agências reguladoras, pesquisadores e membros da academia, investidores, etc) e também do debate acerca das principais questões industriais em fóruns de alto nível de conhecimento.
No primeiro dia, os palestrantes abordaram o desenvolvimento sustentável e os materiais naturais. Já no segundo dia de evento, discutiu-se sobre atualizações em marketing e impactos sociais e sobre o mercado consumidor.
E o que é então sustentabilidade? A intersecção entre os setores econômico, social e ambiental (e não apenas este último!!! O Cosmética em foco já abordou sustentabilidade e você pode ler aqui e aqui). A Holonomics Education defendeu inclusive que “a chave da sustentabilidade é a conscientização de todos”. Você sabia que se as 7 bilhões de pessoas consumissem como um consumidor regular de classe média precisaríamos de 5 planetas??? Já passou da hora de repensarmos nossos hábitos e gerarmos impactos positivos (ao invés de tentarmos reduzir os impactos negativos apenas).
Para falar sobre o tema, é imprescindível entender um pouco do que aconteceu na COP21 do último ano, que buscou alcançar um novo acordo internacional sobre o clima, aplicável a todos os países, com o objetivo de manter o aquecimento global abaixo de 2°C. Uma observação bastante relevante abordada no SCS durante discussão sobre a COP21 é a de que a maioria das empresas envolve a sustentabilidade apenas ao final do processo de inovação dos seus produtos e o faz de forma pouco importante. Seria mais válido aumentar este envolvimento, para que o processo de inovação fosse mais robusto (usaria menor quantidade de recursos – financeiros, energéticos, de matérias-primas – e de forma mais consciente). Não faz mais sentido?
O evento foi rico em exemplos de empresas, como a Natura e a The Body Shop, que demonstraram buscam o relacionamento com cooperativas e comunidades locais a fim de obter confiança e rastreabilidade dos ingredientes por eles extraídos e utilizados pelas empresas na composição de suas formulações. Em contrapartida, eles garantem a compra da mercadoria por preço justo. Muito se falou sobre fair trade. Você sabe o que isso significa? Eis a explicação.
O assunto que gerou maior curiosidade na plateia foi a questão da certificação dos produtos contendo matérias-primas naturais (sejam elas denominadas verdes, orgânicas, veganas ou qualquer outro nome). Muitos são os certificados existentes e, exatamente por isso, o consumidor continua perdido sem saber o que cada um de fato quer dizer. Como se não bastasse o fato de ainda hoje não existir um certificado unificado para produtos que contenham estas matérias-primas, obter estas certificações é um processo bastante lento e caro. A situação torna-se ainda mais complexa (e dispendiosa!) quando a empresa produz muitos produtos passíveis de obter a certificação e se é desejo da empresa exportar o produto, já que cada país reconhece uma certificação e obter todas elas seria completamente insano- conforme podemos concluir a partir deste texto já publicado pelo Cosmética em Foco. As empresas que optam por comercializar seus produtos sem certificado (o que corresponde a 70% dos produtos orgânicos) devem focar na transparência para com o consumidor. Um rótulo ambiental único já se encontra em execução em projeto piloto mundial, contudo ainda não está aplicado a nenhum produto cosmético.
Uma questão crucial foi abordada durante o evento: os ingredientes naturais são realmente mais benéficos às pessoas e ao planeta? Depende!!! Cada situação deve ser analisada especificamente, pois as vantagens encontradas nos materiais renováveis e biodegradáveis nem sempre são as desejadas ou são assim tão melhores que os sintéticos. Qual seria então a solução? Reduzir! Ao reduzir a quantidade de material, reduz-se também o impacto por ele causado. As outras decisões são mais complexas e exigem mais raciocínio até o veredicto final.
Outra discussão bastante polêmica foi o uso de animais em testes in vivo e o que se apresentou foi, mais uma vez, a vilanização destes em detrimento da segurança do consumidor. Progressos têm sido feitos no sentido de que eles sejam substituídos por testes alternativos, contudo isso ainda não é completamente possível. Aqui também a solução é a redução: no último ano, foram utilizados 900 animais para testes em toda a Europa. Enquanto progredimos no sentido da substituição dos animais, devemos seguir reduzindo este número.
Algumas palestras foram também inspiradoras, tais como a da Nação Verde e seu jeito peculiar de fazer negócio, da Terracycle Brasil e o aproveitamento de materiais de difícil reciclagem, a Feito Brasil e sua identidade única no mercado brasileiro e também o Wisewaste e a conscientização do pós-consumo.
Tradução: “Nós não poderemos dizer aos nossos filhos que nós não sabíamos”.
“Mais tarde será tarde demais.”
Como conclusão de tudo o que foi discutido lá, podemos salientar que a avaliação da substituição de um ingrediente sintético por outro natural é sempre bem vinda e específica para cada caso. Acreditar que esta substituição é sempre benéfica é, além de ingenuidade, falta de conhecimento. Por exemplo, nem sempre o uso de energia para se obter aquela matéria-prima natural é menor. Nem sempre a quantidade de resíduo produzida é menor. Existe sim uma tendência pela vegetalização das formulações cosméticas, contudo é impossível banir os ingredientes sintéticos que ainda se façam relevantes para o negócio.
Além disso, ainda é ponto crítico o fato destas matérias-primas encarecerem o produto e o consumidor ainda não parece estar disposto a pagar mais por um produto cuja vantagem ele não entende. A partir do momento em que o desgaste ambiental fizer parte da precificação do produto, os ingredientes naturais serão economicamente (e quiçá estrategicamente) mais atrativos. Como incentivo, a Cargill sugeriu o uso de óleos vegetais, como o óleo de soja, a preço de commodity.
A expectativa é que em um futuro próximo a sustentabilidade não seja diferencial, mas sim exigência: por parte da mídia e das cadeias de produção, dos consumidores e também da popularização do “mercado verde”. Quanto aos consumidores, muito se falou sobre a necessidade de que as empresas sejam transparentes e autênticas quanto aos seus valores, pois o consumidor não quer apenas comprar objetos… hoje ele quer algo em que acreditar! Para isso, as empresas precisam entender que toda a organização é responsável por entregar, com alma, a melhor experiência possível ao consumidor.
E quais são seus esforços diários para gerar impacto positivo no mundo que vamos deixar para as nossas crianças?